quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Gabriel Lima de Sá

Guajarina e um dos criadores de um estilo peculiar da literatura de cordel, o trava-língua. Foi autor de “Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum”, letra que mais tarde foi gravada por Nara Leão e João do Vale.
João Martins de Athayde
Foi o principal editor da literatura brasileira de cordel. Nascido em 1880, em Cachoeira da Cebola, Paraíba, Athayde foi mascate e pai de 25 filhos. Em Recife, fez um curso de enfermagem e depois comprou o projeto que viria a ser sua editora. Mais tarde, passou a escrever suas próprias obras, como “Serrador e Carneiro”.

AUTORES E POEMAS

APOLÔNIO ALVES DOS SANTOS

ANTÔNIO CONSELHEIRO E A GUERRA DE CANUDOS

Vamos ouvir a história
De Antônio Conselheiro
Que apesar de beato
Temente a Deus verdadeiro
Em defesa de Canudos
Se tornou um guerrilheiro

O seu nome verdadeiro
Era Antônio Maciel
Que se fez um penitente
Dum sofrimento cruel
Mas apesar de sofrido
Era uma alma fiel

Vamos saber como foi
Que ele foi convertido
Em beato peregrino
Triste e arrependido
Por dois monstruosos crimes
Ter ele então cometido

Porque ele se casou
Com uma linda deidade
Bonita como uma santa
Do altar da divindade
A qual foi vítima inocente
Duma cruel falsidade.

Porque a mãe de Antônio
Com a nora não se dava
Para o filho abandoná-la
Sempre o aconselhava
Mas suas falsas calúnias
Ele não acreditava.

Mas ela vendo que o filho
Não queria acreditar
Em suas falsas calúnias
Resolveu a levantar
Um falso a sua nora
E que pudesse provar

A velha disse: Meu filho
Toda vez que você vai
Viajar de madrugada
A sua esposa lhe trai
O macho dela já sabe
A hora que você sai

Se quiser ter a certeza
Escute o que vou falar
Diga a sua mulher
Que hoje vai viajar
E fique perto da casa
Para se certificar

Verá um homem chegar
Aproveitando o escuro
E ficar atrás da casa
Com o seu plano seguro
Esperando que ela venha
Abrir o portão do muro

E assim Antônio fez
Disse pra sua senhora:
Hoje eu vou viajar
Procurar trabalho fora
Não sei se voltarei logo
Ou tenha uma demora

Então a velha maldita
Que estava prevenida
Para confirmar a trama
Com ideia pervertida
Trajou-se em roupa de homem
E caminhou decidida

De lá Antônio saiu
No horário acostumado
Resolveu se ocultar
Num recanto do cercado
Nisto viu chegar um vulto
Em um capote embrulhado

Antônio que estava armado
Com um revólver munido
Mandou pipoca no vulto
Ouviu-se grande estampido
A mulher abriu a porta
Pra ver o que tinha sido

Ele avistando a esposa
Também foi mandando brasa
A mulher soltou um grito
Igual a quem se arrasa
E mortalmente ferida
Caiu pra dentro de casa.

E Antônio Maciel
Bastante enfurecido
Correu para examinar
Aquele vulto caído
Para ver se conhecia
Quem ele havia abatido.

Quando ele descobriu
O rosto da genitora
Gritou: Valha-me Jesus
E Maria protetora
Assassinei minha mãe
Sendo ela a causadora.

Naquele momento ele
Compreendeu a cilada
Disse: Também atirei
Na minha esposa estimada
Se ela também morreu
Não tive culpa de nada

Correu para ver sua esposa
No momento extravagante
Ela ainda estava viva
Porém muito agonizante
E ele ainda contou-lhe
A história horripilante.

Ela disse: Meu esposo
Eu vou morrer inocente
E tu também me matastes
Sem prova e inconsciente
Mas por ti peço perdão
Ao nosso Onipotente.

Antônio depois que viu
A sua esposa querida
Morrer apertando a mão
Do seu esposo homicida
Naquela hora perdeu
Todos prazeres da vida

E sem mais perca de tempo
Foi entregar-se à prisão
Então depois de cumprir
A sua condenação
Saiu como peregrino
Em espinhosa missão

Dizia mesmo consigo:
Hei de viver como incréu
Pois mediante o que fiz
Ainda sou triste réu
Paguei a pena da lei
E não a pena do céu

E saindo mundo afora
Com gesto de tresloucado
Barbas e cabelos grandes
Sujo e esmolambado
E conduzindo no ombro
Grande cruzeiro pesado

Naquele tempo Canudos
Era um pequeno arraial
Antônio chegou ali
Permanecendo afinal
Dedicou-se a conselheiro
Teve o apoio em geral

Havia no arraial
Uma igrejinha indigente
E ele como beato
Pregador e penitente
Tomou a pobre igrejinha
Por seu abrigo dolente

Daí veio o apelido
De Antônio Conselheiro
Logo espalhou-se a notícia
Naquele sertão inteiro
Todo mundo tinha fé
No beato milagreiro

Logo nasceu um despeito
Dum tal padre Ibiapina
Porque viu o conselheiro
Também usando batina
E conquistando os fiéis
Pregando a santa doutrina

Finalmente Conselheiro
Era dali mandatário
Propondo ali no local
Plano revolucionário
Desfazendo da comarca
Como rebelde contrário

Porém todo povo em massa
Gostava do Conselheiro
Porque ele conquistava
Aquele sertão inteiro
Muito embora atribuído
Como ente desordeiro

Pois Antônio Conselheiro
Apesar de pregador
Falava contra a República
Não queria dar valor
Por isso os republicanos
Lhe tinham ódio e rancor

Na cidade Bom Conselho
No estado da Bahia
O governador mandou
Para o juiz certo dia
Uma ordem de expulsar
Antônio da freguesia

Nesse tempo o Conselheiro
Começou a construção
De uma igreja em Canudos
Sem ter autorização
Com isto mais se agravou
A sua perseguição

E acontece que ele
Teve muita precisão
Dumas peças de madeiras
Para fazer armação
Mandou pedir ao juiz
Daquela jurisdição

Então mandou um jagunço
Seguir como encarregado
À cidade Bom Conselho
Comandando um grupo armado
Incumbido de levar
Ao juiz o [seu] recado

Na cidade Bom Conselho
Foi chegado o cangaceiro
Ao prefeito e juiz
Dera como mensageiro
O recado que mandava
O Antônio Conselheiro

O juiz lhe respondeu:
Pode voltar desde já
E diga ao Conselheiro
Que ele conseguirá
O que está pretendendo
Se ele mesmo vir cá

Logo o jagunço fitou
Para o juiz de direito
Disse: Eu dou o seu recado
Porque não tenho outro jeito
Mas sei que o Conselheiro
Não vai ficar satisfeito

Quando o jagunço voltou
Disse: Senhor Conselheiro
O juiz lhe mandou um
Recado muito grosseiro
Me parece que ele está
Com intento traiçoeiro

Disse que o senhor mesmo
Fosse imediatamente
Disse que pretende vê-lo
Com ele de frente a frente
Pois deseja conhecer
O senhor pessoalmente

O Conselheiro pensou
E disse desta maneira:
Vamos todos reunir-nos
Numa missão prazenteira
E vamos a Bom Conselho
Buscar a dita madeira
Na manhã do outro dia
Reuniu um batalhão
De centenas de fanáticos
Como peregrinação
E seguiram a Bom Conselho
Em rigorosa missão

Porém alguns iam armados
De rifles e carabina
Embora por precaução
Pelos reveses da sina
Sem intenção de fazerem
Nenhuma carnificina

Acontece que de lá
O juiz organizou
Um batalhão de soldados
E para o qual convocou
Um tenente como chefe
E a Canudos mandou

Deu-se entre duas serras
O encontro inesperado
E Antônio Conselheiro
Quando se viu atacado
Mandou que abrisse fogo
Foi o combate travado

Então naquele combate
Muita gente pereceu
Do povo do Conselheiro
Quase a metade morreu
E da polícia escapou
O tenente que correu

O Conselheiro ficou
Sem alegria e sem glória
...

Nenhum comentário:

Postar um comentário